terça-feira, 27 de agosto de 2019

O ACUMULADOR (Conto de terror)

Ele era um homem cruel e avarento desde sempre. E sua avareza fora a razão do fim da sua família. A
mulher morrera porque ele se recusava a comprar tantos remédios. Depois do falecimento, os filhos foram embora. Ficou sozinho, vivendo na imensa casa onde cada dia mais armazenava coisas. Em oito meses encheu totalmente os quatro quartos, em cinco, acumulou coisas até o teto na sala, sala de jantar e cozinha. Dois meses depois, tinha que se espremer para passar num espaço mínimo, formado por um amontoado de coisas no corredor. Em cada compartimento, havia menos de um metro de espaço não ocupado. O suficiente apenas para que ele se posicionasse para contemplar sua obra. Tudo que encontrasse no seu dia a dia pela rua, trazia para casa. O que trazia mais, sem o saber, era uma essência invisível juntamente com alguns daqueles objetos. Talvez atraído também pelos seus pecados. Algo ruim, sujo, ensebado e destrutivo. Antes ele até se preocupava com própria higiene tomando banho todos os dias, lavando e trocando de roupas. Com o tempo foi deixando de se lavar e cuidar das vestimentas, se tornando semelhante a um morador de rua, embora tivesse casa e um bom salário de aposentado. Sua seleção de material também mudou. Antes tinha preferência por madeira, peças de automóveis, eletrodomésticos e metal... Mudou seu critério e passou a trazer quase tudo. Sacos de lixo cheios sem sequer examinar o conteúdo. Plásticos, papéis, tecido velho e sujo e até restos de comida. Sua aparência era deplorável. Dormia num canto estreito, reservado, entre caixas que chegavam ao teto. Todas as noites, antes de dormir, ouvia barulhos e movimentos no acumulado de lixo, seguindo em onda, inexplicável. No começo achou que tivesse infestado de ratos, depois que um guaxinim tinha invadido a casa... Guaxinins, porém logo percebeu que nenhum animal faria aquele tipo de coisa. Havia algo por detrás daquela montanha de lixo. Algo que trouxera ou atraíra. Isso pareceu lhe desenvolver uma atração mórbida. Percebeu isso quando exultou de alegria ao trazer para casa um velho crânio do cemitério. Estava por lá pegando rolos de arames usados para sustentar coroas de flores, quando se deparou com os restos mortais. Não pensou duas vezes, peguei o crânio desdentado e sem maxilar e jogou no seu carrinho. Voltou ao cemitério em busca demais. Levou ossos, depois mais crânios. Passou a limpa-los, fixar os maxilares com arames, poli-los e coloca-los sobre uma pequena estante. Não diminuiu o interesse nos outros materiais, porém os crânios e ossadas se tornaram um tesouro. Ia toda semana ao cemitério. Discreto, fingindo outros interesses para não ser descoberto, revolvendo covas abertas em busca de restos mortais. À noite ficava no seu canto, sentindo o odor misto do lixo e ossos de defunto, vendo na meia luz, o lixo se movendo em fluxo, por algo inexplicável. Ele tinha uma clara sensação de que afundava na lama, no lixo e sujeira viva, como a suposta sopa química do começo dos tempos de onde se originara vida. E ao mesmo tempo ele sentia ódio do que era limpo, das pessoas. Isolado, nem lembrava qual fora a última vez que trocara palavras com outra pessoa. Ainda assim, sentia que não estava só. Alguma coisa do lixo viera caminhar ao seu lado. Uma espécie de encosto, como diziam. Uma sombra invisível que o seguia por toda parte e que nadava a noite naquela sujeira toda. Um dia ambicionou ter um crânio fresco. Curtir a pele de algum indivíduo também lhe pareceu interessante. Matou um moleque de quinze anos, também catador que encontrou num dos terrenos baldios da cidade. Levou o corpo mirrado do menino no seu carrinho. Dali não parou mais. Meses depois, quando morreu num terrível incêndio no monte de lixo que acumulara em casa, foram encontrados trinta e cinco crânios e incontáveis ossos calcinados. Fora da casa, sob um pequeno abrigo, um espaço com pia, facas e outros objetos destinados a tratar dos cadáveres. Ali também havia pele, mãos e pés humanos. Nunca se soube quando deixara de roubar ossos para cometer assassinatos.

terça-feira, 20 de agosto de 2019

NEGLIGENTE (Conto de terror)

Os dois policiais se surpreenderam grandemente ao ver o rapaz nu e cambaleante pela rua naquela
tranquila manhã. Se entreolharam e, sem dizer nada, saíram quase ao mesmo tempo da viatura. Hesitantes, cercaram-se do rapaz que os olhou lentamente, revelando estar sob efeito de álcool ou alguma outra droga. Talvez um misto dos dois. Afinal nada era demais para a juventude. Nunca se sabia que tipo de surpresa tosca ou desagradável os jovens proporcionariam. “Que aconteceu, rapaz? ” Perguntou o policial mais velho. O rapaz o encarou como se não tivesse entendido o que ele havia dito. “Que foi que houve? ” O outro policial perguntou. O jovem disse algo ininteligível revelando ainda mais seu estado alterado. O policial mais velho balançou a cabeça, voltou-se para o parceiro e sugeriu que ele talvez tivesse sido drogado e roubado. O outro concordou com a possibilidade. O rapaz estava nu, as mãos à frente, escondendo a genitália, ombro encostado no muro. Ele voltou a falar e disse coisas incompreensíveis, mas o que chamou a atenção foi o fato de fazer indicações, revezando nos gestos e a proteção ao próprio sexo. Parecia indicar um lugar e fazia isso com uma estranha expressão no olhar. Os homens ficaram conversando, especulando sobre o que o jovem podia estar indicando. “Ele tá indicando algo. Será que é onde foi roubado?” Se perguntou o policial mais velho. O outro se aproximou ainda mais do rapaz e falou pausadamente: “O-que-a-con-te-ceu-e-xa-ta-men-te-com-vo-cê?” Talvez assim ele pudesse entender e dar uma resposta mais clara. O jovem repetiu os gestos e falou coisas que não deu pra entender. O policial mais novo teve a impressão de que ele estava falando em outra língua. Fez outras perguntas pausadas, mas não houve progresso. “Isso não tá funcionando...” O policial mais velho pediu calma. Conduziu o rapaz para dentro da viatura, para a parte detrás, como um prisioneiro. “O que vai fazer?” quis saber o policial mais jovem. Seu colega explicou que iam leva-lo pelo caminho indicado, talvez pudessem entender o que tinha acontecido. Qualquer coisa, o levariam para a delegacia. Apesar da situação, o rapaz pareceu mais tranquilo. Em poucos minutos, os homens da lei pararam diante de um prédio. Conduzidos pelo jovem, que parecia nervoso ou excitado, os homens entraram e subiram alguns lances de escada. O policial mais jovem parecia preocupado, mas seu parceiro estava bastante tranquilo e disse apenas para o outro ficar atento, nada mais. Só iam esclarecer aquela história. Pararam diante da porta de um apartamento. O rapaz algemado fazia indicações ainda mais veementes e parecia assustado. O policial mais velho bateu à porta. Um homem alto e loiro surgiu na porta. Pareceu surpreso, ainda mais ao ver o rapaz ali, quase se escondendo atrás dos homens da lei. A história toda foi contada. “Os senhores queiram desculpar a mim e meu parceiro”, iniciou o homem do apartamento. “Nós somos amantes, estávamos bebendo, depois fomos fazer umas brincadeiras... A coisa não saiu bem e começamos a brigar. E ele fugiu. Como podem ver tão bêbado que deixou as roupas!” O policial mais velho olhou para o colega com ar jocoso. “Amantes? Brincadeiras?” Os dois homens da lei se esforçaram para não rir. Tudo fora esclarecido e apesar daquela perversão, estava tudo bem. Os policias gentilmente conduziram o jovem ao namorado, mas este pareceu assustado. Falou outras coisas ininteligíveis. Descendo as escadas, os policiais começaram a rir. “Dois anormais!” Disse um. “Pelo menos fizemos a boa ação de reunir os pombinhos”, disse o outro e riu ainda mais. Enquanto isso, no apartamento, o jovem nu era estrangulado até a morte pelo homem loiro. “Agora você não me escapa!” Depois este fez sexo com o cadáver do rapaz, o cortou em partes, comeu sua carne nas semanas seguintes e guardou sua cabeça como um troféu.

sexta-feira, 16 de agosto de 2019

O ESTRANHO CASO DO IRMÃOS URIAS (Conto de terror)

Fernando e Felipe Urias tinham respectivamente, doze e dez anos quando a mãe deles faleceu. Os
garotos moravam na periferia do Rio do Janeiro com a mãe, duas tias, a avó e alguns primos. O pai deles havia sumido a pelo menos cinco anos. A mãe, sofrendo de depressão, se enforcara numa árvore, no quintal de casa. Um mês após a morte dela, fenômenos estranhos começaram a acontecer. Objetos saíam do lugar, barulhos estranhos eram ouvidos pela madrugada, coisas pegavam fogo e desenhos escritos, com o que parecia ser sangue, surgiam nas paredes. A família que tinha ligação com grupos evangélicos, chamou os religiosos para interceder em orações pelos jovens. Logo na primeira intervenção, um jovem pastor viu um clarão surgir entre os garotos e teve seu rosto queimado. O homem disse que fora à casa com um certo ceticismo, mas comprovou que a coisa era para valer. Um grupo de obreiros se reuniu numa noite em volta dos jovens e logo se viram em meio a um turbilhão de objetos atirados contra eles. Apesar do testemunho de familiares e dos religiosos, muita gente achou que os garotos estavam fingindo. Ainda mais quando disseram que a mãe e outros espíritos falavam com eles. Segundo os garotos, a voz deles surgia de madrugada e não os deixava dormir. A tia deles disse ter ouvido vozes estranhas, nada parecida com a da irmã e que não podia garantir que fosse os meninos que não estivessem fazendo imitações. Um especialista em atividades paranormais foi até a casa da família Urias e disse estar em dúvida sobre o caso se tratar de um poltergeist ou haunting. No primeiro caso, se tratava de uma atividade psicocinetica ligada a um adolescente manipulando objetos involuntariamente. No segundo caso, se tratava-se de acontecimentos ligados a mortes violentas. No caso dos irmãos Urias havia características de ambos. O especialista disse que apesar de, em ambos os casos, haverem características comum, aquela situação em particular era diferente e indistinta. Outros especialistas vieram e embora um ou outro afirmasse ter classificado a situação devidamente, não houve propostas de uma solução. Outros religiosos vieram, mas a situação das crianças apenas piorou. Felipe sofrera terríveis queimaduras nas mãos e antebraços e Fernando tinha crises de choro e eles já não se alimentavam ou dormiam direito. Então veio um homem, em meio a tantos outros que visitavam a casa naqueles dias, que não alegou ser especialista em fenômenos paranormais e nem enviado de Deus. Ele fez um pequeno ritual lendo palavras ininteligíveis, lidas de um livro de capa de couro, aparentemente antigo. Depois conversou a sós com os garotos por meia hora. Logo em seguida os fenômenos cessaram. Os meninos logo se reestabeleceram, mas ficaram taciturnos, isolados dos demais, sempre conversando em voz baixa pelos cantos. Em uma noite, a tia os ouviu dizendo que o outro dia seria o dia certo. Não deu importância para isso até se lembrar do ocorrido pouco depois de encontrar os sobrinhos enforcados na mesma árvore onde a mãe deles também cometera suicídio. No bilhete deixado por Fernando, havia a revelação de que o homem que tinha acabado com os fenômenos viera para convencê-los do suicídio. Alguém os esperava do outro lado e não eram apenas a mãe. E de maneira alguma eles podiam ficar, pois suas presenças trariam o pior para a família. Apesar das tentativas, que contaram com ajuda policial, ninguém jamais conseguiu descobrir a identidade do homem que convencera os jovens.

terça-feira, 13 de agosto de 2019

REFLEXÕES DE UM JOVEM MATADOR (Conto de terror)

Estou aqui deitado, sozinho no escuro, pensando naquelas coisas e questionando minha sanidade
. Indagando a mim mesmo o que senti e porque senti... Coisas incompreensíveis que se misturam a sentimentos novos e conflitantes. Eu simplesmente experimentei uma satisfação imensa com o que fiz. Ainda sinto os braços trêmulos e o volume na minha mão esquerda... Todo o cheiro está em mim. E eu diria que não apenas de uma maneira física. Eu o sinto em minhas narinas, mas de uma maneira essencial. É difícil dizer. É como se o ato em si tivesse uma espécie de energia que pairasse sobre mim. É algo vivo e tangível, embora apenas pareça flutuar diante do meu peito e face. Falo assim, embora seja um sujeito que nunca descreveu as coisas de maneira esotérica. Além disso, algo em mim mudou. Claro que o assassinato deve mudar toda e qualquer pessoa que o pratique, mas no meu caso, creio que virei a chave da minha existência para um novo modo de vida. Um modo de vida que já estava lá, cuja suspeita eu observava surpreso e comedido. Eu mexo meus dedos e sinto também o sangue secando em minhas mãos e penso que foi para isso que elas foram feitas. Não deveria ter demorado tanto a cumprir seu propósito... Ou talvez eu tenha feito as coisas no momento certo. Tenho apenas 20 anos. Isso é ser jovem para qualquer profissão ou atividade na vida. Acho que sou um pouco maluco... Ou me tornei depois do que fiz. É nisso que eu mais penso. Não tenho nenhum remorso ou arrependimento, mas não acho que eu seja um psicopata. Creio que meus sentimentos pelas pessoas são apropriados. Gosto e odeio seres humanos normalmente e nunca maltratei animais ou fui desprovido de empatia. Penso que para ser um psicopata, isto é essencial. Ou não? Bem, não sou nenhum especialista. Só tenho certeza de que sou um pouco maluco... Entretanto não muito mais que a algumas pessoas. Falo dessa maluquice básica que movem os grandes gênios, artistas. Não que eu me ache uma pessoa brilhante, genial, mas creio estar acima da média. Descobri no assassinato um enorme prazer, um propósito de vida. Só isso. Sei que a maioria não pensa assim. Os que matam são em geral bandidos, pessoas se vingando ou completamente loucas. Não estou incluído em nenhum desses casos. Não nasci doente ou completamente insano, mas capaz de ver na morte uma espécie de obra de arte. Não, não devo ser o primeiro a pensar e dizer essas coisas. Talvez eu esteja aqui apenas para reafirmar que pessoas como eu existem. E que não somos simplesmente malucos ou perversos. Sou um assassino da mesma maneira que um gato nasce para se alimentar de carne. Não há necessidade de questionar isso. O que me incomoda agora um pouco é pensar que eu podia ter escolhido outras vítimas para começar. Matar meu irmão, pai e mãe logo de cara, pode ser algo extremo.

quarta-feira, 7 de agosto de 2019

RASTROS DO PASSADO (Conto de terror)

Eu tinha nove anos de idade, mas lembro bem. Nós morávamos numa cidade pequena e tranquila.
Tão pequena e tranquila que continua praticamente do mesmo jeito após esses trinta anos. Não que eu ainda a visite, não posso fazê-lo. Mesmo sabendo pelas pessoas que lá vivem, que é um lugar absolutamente tranquilo, para mim é uma cidade de fantasmas. São cinco pelo menos. Tudo começou quando um garoto da minha rua foi encontrado morto num descampado. Havia sinais de tortura e outras coisas que os adultos evitavam falar na minha frente, na frente das outras crianças. Depois o mesmo aconteceu a outro garoto. Encontrado sob alguns arbustos, próximo a um campo de futebol. A terceira vítima era um garoto que eu conhecia bem. Acho que devo ter sido a última pessoa a vê-lo... E tenho quase certeza de que eu podia ter sido a vítima no lugar dele. Nós tínhamos sido os últimos a ficar em uma pracinha brincando nos velhos balanços com tinta descascando. Eu fui embora e ele disse que ia ficar mais um pouco. Eram pouco mais de dez da manhã. E nem o mais exagerado dos pais podia imaginar alguém fazendo mal a crianças sob aquela luz do dia. Isaque sumiu e só foi encontrado uma semana depois, em um matagal na entrada da cidade. Dessa vez os pais, descontrolados, comentaram na frente das crianças as coisas horríveis que tinham sido feitas. O menino fora queimado por cigarros, amarrado pelos pés e mãos, cortado, sodomizado e depois enforcado. A pequena cidade ficou em pânico. Ninguém lembrava de alguém que tivesse morrido de morte violenta naquele lugar. O caso mais terrível tinha sido de um vaqueiro por conta de uma queda de cavalo, anos atrás. Tão incomum quanto os crimes, era a presença de dois homens recentemente chegados a cidade. Eles tinham vindo pouco antes do primeiro desaparecimento, suscitando conversas sobre o seu modo de vida que causava indignação nos homens e ruborização nas mulheres. Como assim eles não são irmãos? São o quê?! Falavam os mais indignados Após a morte de Isaque, boatos e rumores se voltaram contra os supostos pervertidos da cidade. Não demorou para que acusações públicas começassem a ser feitas. E então, numa noite, um grupo de pais exaltados, foi até a casa dos homens e os prendeu. Eles foram trazidos até o nosso terreno, imenso naquele tempo. Ali foram julgados, condenados e executados. Eu vi tudo pelas venezianas da janela do meu quarto, anônimo. Nunca poderei esquecer seus gritos, seus rogos por misericórdia e a maneira como se debateram ao serem erguidos pelo pescoço, enforcados sob a luz da luz e o silêncio acusador do grupo liderado por meu pai. Depois os corpos foram queimados. Alguns meses depois, na cidade vizinha, um maníaco foi preso por ter raptado um garotinho. A polícia conseguira se antecipar, seguindo seu rastro, libertando o menino a tempo! O homem confessaria seu rastro de crimes. O silêncio sobre os dois homossexuais continuou. Eu olhava para o meu pai e era incapaz de pensar noutra coisa que não aquele assassinato. E isso durou anos Ele nunca falou sobre o caso. Faleceu sem arrependimentos aparentes. Eu, sentia vergonha, mesmo sem culpa alguma. Na primeira oportunidade, deixei aquela cidade para não mais voltar. Para mim, apesar de pacata, representa apenas: fantasmas, injustiça, preconceitos e ódios soterrados.

sexta-feira, 2 de agosto de 2019

ABDUZIDOS (Conto de terror)

- Deus me perdoe, mas era preferível que tivessem sido encontrados mortos – disse um dos pais de
um dos meninos em um momento de claro desespero. O grupo de escoteiros de cinco garotos estava desaparecido há mais de uma semana. Os adolescentes, experientes em explorar e acampar, haviam partido nessa expedição sem um instrutor mais velho porque confiavam em suas habilidades e conhecimento prévio da floresta. Já haviam acampado naquele local algumas vezes. Embora dissessem que se tratava de uma floresta assombrada e misteriosa, o último caso de desaparecimento registrado já tinha mais de vinte anos. Havia também as histórias acerca de um ermitão que vivia em uma cabana no meio do mato, que fora preso acusado de assassinatos – nenhum deles na floresta – e que tinha na cabana um crânio humano. Embora essas histórias existissem e as pessoas tentassem assustar umas às outras com o desaparecimento e o ermitão assassino, o lugar era tranquilo e bastante frequentado por famílias inteiras que faziam piqueniques às margens do lago no meio da floresta. Adolescentes mais empolgados continuavam fazendo vídeos com seus celulares dos restos da cabana abandonada do matador, simulando cenas do filme A bruxa de Blair e era só isso... Até aquele domingo em que os escoteiros não atenderam seus telefones e não mais regressaram. As buscas foram reforçadas por vários voluntários, além do auxílio de helicópteros. Acharam o local do acampamento dos garotos, as barracas ainda estavam armadas e havia alguns objetos no local. A impressão que se tinha era que os meninos tinham fugido dali apressados, tendo tempo somente de levar suas mochilas e materiais mais necessários. A busca foi tão minuciosa que, um dos homens do corpo de bombeiros, perdeu sua lanterna em um dia, mas tornou a encontrá-la depois, tamanha foi a varredura feita pelas equipes. Começou-se a especular que os meninos tinham atravessado toda a floresta em direção à BR, tomado algum transporte, deixando o estado. O problema é que não havia sentido terem feito isso de livre e espontânea vontade, ainda mais os cinco. Óbvio que surgiram também histórias bizarras da volta do ermitão assassino, discos voadores e raptores de adolescentes. O fato é que as pessoas se afastaram do lugar classificando-o como maldito. Um dia um incêndio criminoso acabou com três terços da floresta. Estranhamente, a terra calcinada nunca se recuperou. Uma indústria direcionou seu esgoto para o lago e a vida no lugar tornou-se insustentável. A bela região repleta de verde deu lugar a um pequeno deserto cinzento com um esgoto à céu aberto. Sinal algum dos escoteiros foi encontrado, jamais. Um dia um sujeito – que conhecia a história do desaparecimento - foi categórico em afirmar que vira cinco garotos andando em meio àquela desolação. Ao se aproximar deles, os mesmos sumiram diante de seus olhos. Há quem pense que os meninos foram raptados, levados para longe, mas há também quem afirme que os meninos estão mortos e enterrados no lugar e por isso nunca foram encontrados. Outros rumores surgiram de pessoas que dizem ter vistos os fantasmas errantes dos adolescentes. O mistério continua.